top of page
  • Foto do escritorFrancisco Weyl

Weyl estreia Mazagão depois de 16 anos


O que era para ser um filme épico tornou-se um processo criativo o de 16 anos, em que o realizador, produtor, pesquisador, antropólogo das imagens, e poeta Francisco Weyl deixou maturar como um bom vinho a se degustar com os melhores amigos.

A obra é um curta quase média metragem de cerca de 18 minutos nos quais o criador alterna imagens fotográficas com imagens capturadas em Super-8 milímetros, ambientadas por uma canção ameríndia autoral do falecido poeta e compositor Konstantin Richter, que autorizou ainda em vida o uso da música no filme.

Mazagão, a cidade fênix é estruturada por um longo texto do realizador no seu devir pesquisador, onde Weyl recorre à Semiótica para falar de Mazagão, seu deslocamento e ressurgimento, a mise-em-scene das representações das batalhas entre mouros e cristãos, as vias de pesquisa temática de Mazagão, e da própria metafísica mítica que envolve a tríade África-Europa-Brasil.

O filme Mazagão, cidade fênix também renasceu das cinzas, tendo estado adormecido como um vulcão durante anos, tempo que o realizador teve para aprofundar suas pesquisas e refletir sobre os processos que o levaram de Portugal, onde habitava em 2005, até Mazagão, a articulação, os percalços e a desmontagem da equipe de produção, as viagens e filmagens em suportes digital e película Super-8 milímetros.

Este é o segundo filme que Francisco Weyl realiza em 2021 (recentemente, ele estreou no VII Festival Internacional de Cinema do Caeté o seu EXERCITO, em que faz uma leitura da poética visual da artista portuguesa Ana Tinoco, sendo que, em 2020, ele lançou o filme "Cio na primavera em Braccara Augusta", e os projetos audiovisuais "A parreira de Suruacá", e "Altamira Feminista").

Com texto, Montagem, e Realização de Francisco Weyl, "Mazagão, a cidade fênix" tem imagens em Super-8 MM capturadas pelo próprio realizador e Ricardo Leite, fotografias de Helga Roessing Richter, música de Konstantin Richter, e produção de Aroldo Pedrosa.

Assista no Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=xd5C8hcXfXs





(Segue texto que acompanha a obra)


Mazagão


Antes de submeter parte do Norte de África aos seus domínios, fora Portugal dominado pelos árabes: esta “expansão colonizadora” (portuguesa) é realizada de forma subdominada: Portugal chega à África com o substracto cultural Árabe, o que (re-des-)SIGN(ific)a que esta aventura (colonizadora portuguesa) tem atrás de si uma necessidade histórica, a de retorno ao útero arquetípico, à sua própria natureza.

Este processo (mítico-genealógico) tem correspondência com a colonização da Península Ibérica pelos romanos, cuja cultura (impregnada pelos signos gregos que “exportou”/expandiu) foi contaminada pelos signos de culturas autóctones (às quais dominava). Estes fenômenos produziram os substractos culturais (e linguísticos), os quais, articulados aos signos desta cultura greco-romana, fundou, em Portugal, os mecanismos de resistência que mais tarde viriam a celebrar a mater-língua-portuguesa.

Se continuarmos este percurso analítico de carácter Semiótico, poderemos concluir que, no caso Mazagão, pode-se identificar uma trí4de (imperfeita), constituída da seguinte forma: (África)Portugal-África-Brasil, onde: Primeiro, África é ícone; Segundo, Brasil é índice; Terceiro, Portugal é símbolo. A partir desta categorização, será possível, portanto, re-des-SIGN(ific)ar Mazagão: os “seus” signos atravessam/atravessados, destravam/alavancam a História – ciência-mãe – para além de seus campos e de suas fronteiras racionais.

Mazagão, ao deslocar-se/migrar-se, transforma-se. Os “seus” signos, importados/transportados – (da África para Portugal) de Portugal para a África e da África para o Brasil - expandem-se: os signos que trans-im-porta da África e os que “encontra” no Brasil (mediados por signos de uma terceira cultura, a portuguesa) entrechocam-se, impregam-se: esta mediação (portuguesa), portanto, torna-se o campo da afinidade - entre uma cultura autóctone (africana) e uma cultura migratória (árabe-portuguesa-árabe), que re-nasce do choque com as culturas autóctones amazônicas (outras terras dominadas pela Coroa Portuguesa). A mediação (portuguesa) realiza-se através de um processo de dominação-dominada.

Última praça portuguesa na África, última cidade edificada pelo projecto de colonização pombalina na Amazônia, Mazagão porta consigo um estandarte simbólico. A migração do povoado, entretanto, não se traduz em uma trans-urbanidade, ela nos fornece pistas, conduz-nos a um processo que atravessa o tempo, mas que, simultaneamente, prende-se a determinados aspectos históricos. As minhas leituras levam-me a crer que existem duas linhas de pesquisas sobre Mazagão, uma se dirige para a África, a outra, para a América do Sul. A linha de Marrocos acentua a Arquitetura, a do Brasil, a Arqueologia. Entre um e outro continente, miscigenam-se os arquétipos, brotam-se os seres humanos, com suas re-des-SIGN(ific)ações.

As investigações (arqueológicas e arquitetônicas) sobre Mazagão, com todos os seus rigores e contributos ao percurso humano em direção ao conhecimento científico, têm-se revelado limitadas para interpretar as estruturas míticas que emergiram - pela via dos arquétipos - nos universos das gerações que sucederam aos guerreiros brancos-cristãos-portugueses, arrastados à força do Norte da África para o Norte da América do Sul, os seus laços com as comunidades amazônicas e as suas naturais reações (ou as suas “novas” guerras, interiores, psicológicas) à Coroa Portuguesa. Transportar cerca de 300 famílias de guerreiros para que se tornassem colonos no Brasil acabou por destruir-lhes a virilidade, foi obra que durou cerca de três anos, precisou de algumas viagens atlânticas, e caracterizou-se por trocas de epístolas e ordens imperiais, que, afinal de contas, foram obedecidas. Mas: o domínio de um espaço em terras árabe-muçulmanas SIGN-i-FICAVA, para aqueles homens, mais que a imposição de um Império (Português), pois que era já a sua própria a(con)firma-ção/autenticação cultural - de seres educados/preparados para a guerra, a mesma guerra através da qual a História se desenvolve e faz evoluir a experiência humana.

Mazagão, portanto, nasce (na África), desloca-se (além-mar), migra (para o Brasil), re-funda-se (na Amazônia), afunda-se (desaparece com uma epidemia), re-nasce (alguns quilômetros rio Mutacá acima) e re-nasce, desta sua saga nômade, com este seu caráter trans-urbano, substancia uma forma de resistência, mítica, que transporta/miscigena substratos (culturais), semioses (signos), histórias, de vários povos (que se atravessam em suas travessias), sejam elas (d)escritas (observadas) ou (simplesmente) experienciadas nos lugares de uma temporalidade (diacrônica e/ou sincrônica), que, sendo científicas, simultaneamente, escapam aos olhos da cientificidade.

Com o olhos de Tirésias, MAZAGÃO, o filme, desvela estes fenômenos, de uma forma antropológico-visionária: propõe um ritual de passagem - de uma “fala” histórica para uma “fala” mítica. Esta passagem - da História para o Mito - será realizada em alto mar. E a Festa de São Tiago, que reproduz, em Mazagão Velho, na Amazônia, Norte do Brasil, os confrontos entre portugueses e mouros, ocorridos no Norte de África, será o abre-alas desta passagem. Com estes elementos alegóricos, portanto, MAZAGÃO é este filme trágico, narrado na forma de um poema épico, com recorrências às estruturas trágico-míticas das máscaras, potenciais condutoras das representações arquetípicas humanas. O filme, cronológico, acompanha a migração de Mazagão. A referência estética desta narrativa será estruturada de forma a destacar o componente histórico-migratório de Mazagão, este lugar utópico e mítico, que (R)existe no campo imaginário, a-temporal e a-geográfico, portanto, um não-lugar simbólico, um Portugal deslocado de África para o Brasil.


Francisco Weyl








27 visualizações0 comentário
bottom of page