FICCA 10 ANOS – A FORMAÇÃO COMO ESTÉTICA DE RESISTÊNCIA
- Francisco Weyl

- 15 de ago.
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Atualizado: 14 de out.
Oficinas reafirmam compromisso com a Amazônia profunda
Na contracorrente dos grandes centros e da lógica do entretenimento industrial, o Festival Internacional de Cinema do Caeté (FICCA) completa dez anos como um dos mais importantes projetos de formação audiovisual crítica, estética e popular da Amazônia brasileira. Não é exagero: o FICCA é, há uma década, um corpo insurgente que habita o cinema como território político, e a educação como forma de reinvenção do mundo.
Criado em 2015, com os pés fincados na zona bragantina e o pensamento voltado às bordas do mapa, o FICCA segue apostando na formação como processo estético e pedagógico de transformação. É com esse espírito que, neste agosto de 2025, o festival retoma suas oficinas presenciais, reunindo estudantes, jovens criadores, educadores, cineastas, pesquisadores e mestres populares para uma jornada formativa e criativa em escolas públicas e comunidades de Augusto Corrêa (Patal, 18 e 19/08; e Nova Olinda, 20 e 21/08) e Quatipuru (22, 23 e 24/08).
Cinema do possível, formação do sensível
O FICCA não é apenas um festival de exibição. Seu motor é a criação coletiva, a escuta radical, a performance política dos corpos e das vozes amazônidas. Durante uma década, o festival consolidou-se como plataforma de formação de realizadores periféricos, cineclubes escolares e coletivos de criação audiovisual ligados à vida cotidiana, à ancestralidade e às lutas locais.
Dezenas de oficinas formativas já foram realizadas em comunidades, aldeias, escolas, sindicatos e centros culturais. Em todas, o método é o mesmo: corpo, território, gambiarra, memória e invenção. Não se trata de ensinar cinema, mas de ativar a linguagem cinematográfica como prática de liberdade.
“Fazer cinema aqui não é seguir cartilha. É acionar o que temos – corpo, chão, som, afeto, celular, memória – para contar o que nos atravessa e nos move”, diz Francisco Weyl, idealizador do festival.
Programação formativa 2025: três oficinas, múltiplos mundos
Neste ano especial, o FICCA realiza três oficinas com foco na formação est-ética, na acessibilidade, nas narrativas do território e no ativismo audiovisual. As atividades vão de 19 a 24 de agosto e envolvem jovens da rede pública de ensino e pessoas de comunidades locais.
Cine Inclusivo e Formação Est-Ética19 e 20 de agosto – Escola Lauro Barbosa, Patal (Augusto Corrêa)A oficina propõe uma imersão sensorial na linguagem do cine-manifesto e da videopoesia. Acessibilidade, escuta do corpo e inclusão são os eixos de um cinema criado com e para todos os sentidos. Sessões cineclubistas públicas encerram os dias com debate e celebração.
Cinema da Amazônia – Quem Conta Nossa História?21 e 22 de agosto – EMEF André Alves, Nova OlindaEstudantes são convidados a pensar e filmar o cotidiano como gesto político. A oficina parte da memória e do território para produzir microdocumentários e cinepoemas que narram as pequenas e grandes resistências do povo amazônida.
Da imagem oral ao cinema real22 a 24 de agosto – Monóculo da Vovó, QuatipuruEm Quatipuru, o festival promove uma oficina que explora a transição da narrativa oral para o cinema, reunindo estudantes, jovens e moradores locais. A programação inicia na sexta-feira à tarde com uma roda de abertura sobre a transformação da imagem em objeto visual, seguida por dinâmicas criativas de contação de histórias usando fios e cores, e encerra com a primeira sessão cineclubista, incluindo exibição das obras e debate sobre as histórias que as avós contam.
No sábado, as atividades começam pela manhã com o crochê criativo e seguem à tarde com a oficina “A Palavra que Vira Imagem”, que envolve a criação coletiva de micro-roteiros, filmagens com celulares e microfones, improvisos de gestos e movimentos corporais, e composição dos vídeos gravados. À noite, uma sessão cineclubista comunitária apresenta as produções do dia e promove debate sobre histórias que se escondem e se revelam.
No domingo, a manhã é dedicada à segunda parte do crochê criativo e à roda de encerramento, consolidando a experiência formativa. Ao longo de todos os dias, atividades sensoriais e criativas complementam a oficina, incluindo caminhadas sonoras, roteiros corporais, improvisações com recursos simples, escuta vendada, performances ancestrais e montagem de imagens com propósito de denúncia e transformação.
As oficinas seguem metodologias próprias, criadas no entre-lugar da arte e da educação popular, da militância cultural e da filosofia sensível. Os eixos permanentes incluem: o cinema não como produto, mas como processo, ferida e cura, ferramenta e brinquedo, ato de reexistência coletiva.
“Ao longo desses dez anos, vimos adolescentes se transformarem em cineastas, professores virarem cineclubistas, e comunidades se reconhecerem nas telas. Essa é nossa estética: inventar o que não nos deram, com o que temos”, resume Weyl.
FICCA: uma década de cinema como reexistência amazônida
Mais do que comemorar uma década de existência, o FICCA celebra a permanência da luta e a invenção constante de outras formas de ver, contar e viver o cinema. Em tempos de apagamento e desinformação, o festival reafirma seu papel como trincheira sensível de formação política e artística, forjando redes, ampliando vozes e produzindo imagens que não pedem licença.
De Bragança ao mundo, das praças às telas, o FICCA segue fazendo cinema como quem planta: com afeto, com risco e com a certeza de que as imagens mais potentes são aquelas que nascem do chão que se pisa.
Francisco Weyl – carpinteiro de poesia, jornalista e coordenador do FICCA

Sessão de estréia do filme coletivo "Nas Águas do Tijoca o Patal conta a sua História", resultado de oficina do FICCA na Escola Lauro Barbosa dos Santos Cordeiro, Patal, Augusto Correa (Agosto, 2022)
Audiodescrição:A fotografia mostra uma exibição de cinema ao ar livre à noite, realizada em um espaço aberto com piso de pedra e cercado por árvores.
Em primeiro plano, à esquerda, há uma mesa verde com um projetor de luz ligado, apontado para frente. Atrás da mesa, uma pessoa sentada com camiseta vermelha opera o equipamento. Perto da mesa há uma caixa de papelão no chão.
Ao fundo, em várias fileiras, diversas pessoas estão sentadas em cadeiras de plástico brancas e coloridas, assistindo à projeção. O público é variado, incluindo crianças, jovens e adultos.
As luzes do projetor e algumas lâmpadas próximas iluminam o ambiente, criando um contraste entre o chão claro e as árvores escuras ao redor. A cena transmite clima de comunidade, cultura e convivência, com todos voltados para o mesmo ponto de exibição.
REALIZAÇÃO: X FICCA – Festival Internacional de Cinema do Caeté / Arte Usina Caeté
PATROCÍNIO: Governo Federal/Ministério da Cultura; Governo do Pará/Secretaria de Cultura/Fundação Cultural do Pará, através da PNAB e Lei Semear; da Fundação Guamá, Parque de Ciência e Tecnologia - Guamá; Instituto Sustentabilidade da Amazônia com Ciência e Inovação; e Casa Poranga e de Seu Rompe Mato
APOIO CULTURAL: Multifário; Associação Remanescentes de Quilombolas do Torre/Tracuateua; Grupo de Pesquisas PERAU-PPGARTES-UFPA; Academia de Letras do Brasil; ALB-Bragança; Henrique Brito Avocacia.
APOIO INTERNACIONAL: Livraria Independente Gato Vadio (Porto); BEI Film; Escola Superior de Teatro e Cinema - Instituto Politécnico de Lisboa; Associação Nacional de Cinema e Audiovisual de Cabo Verde; Fundação Servir Cinema Cinema - Cabo Verde
PARCERIA: BRAGANÇA: CVC; Pousada de Ajuruteua; Pousada Casa Madrid; Pousada Aruans Casarão; Mexericos na Maré; Paróquia de São João Batista; AUGUSTO CORREA: Escola Lauro Barbosa dos Santos Cordeiro - Patal; EMEF André Alves – Nova Olinda. PRIMAVERA: Vereador Waldeir Reis; Espaço Cultural Casa da Vózinha; Associação dos Produtores de Guarumandeua; Associação dos Agricultores de Siquiriba; QUATIPURU: Monóculo da Vovó; Associação Quilombola de Sacatandeua; ANANINDEUA: Centro Cultural Rosa Luxemburgo; BELÉM: Cordel do Urubu; Vagalume Boi Bumbá da Marambaia; Cine Curau; Casa do Poeta Caeté.
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COORD. PEDAGÓGICA: ROSILENE CORDEIRO / MARCELO SILVA
COORDENAÇÃO: Francisco Weyl
COORD. PRODUÇÃO: Roberta Mártires




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